quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Por Wilson Barbosa

Terceirização Existencial

A Droga das Drogas

No mundo contemporâneo, por força do hábito e do comodismo, a sociedade atribui às coisas e aos outros, responsabilidades que deveriam ser próprias. Diante dessa realidade estamos presenciando a era da terceirização da vida.
Na saúde, a terceirização se dá à custa das “pílulas mágicas” sob as quais prolifera a homogenia na idéia falaciosa de que elas, as pílulas, resolvem os problemas existenciais das pessoas, mesmo quando esses ‘problemas’ deveriam ser entendidos como necessários para a manutenção e o auto equilíbrio. O grifo sob a palavra problema é porque não necessariamente todos os tipos de problemas são para serem resolvidos. Alguns deles são necessários que persistam em virtude de um processo do desenvolvimento do ser humano. Outros ainda, têm o benefício de ajudar a pessoa no processo de maturação de um fato, de um lapso temporal de tempos remotos da vida, e ainda, por outros motivos quase indecifráveis.
Há hoje uma grande permissividade farmacológica, transposto por custas de um marketing desenfreado da bilionária indústria do remédio em detrimento de causas e fenômenos naturais, colocadas como estados patológicos, havendo nisso uma idéia subliminar a qual fomenta o pseudo entendimento de que o medicamento constitui escopo para problemas de ordem reversa à função ideal da droga. Há uma propensão, nesse sentido, de transferir à medicação, o que deveria ser experenciado, suprimido ou digerido pelo indivíduo. A pergunta que se faz (com uma resposta já subentendida) é: Por que não fazer isso havendo, portanto, essa possibilidade? Mas a resposta subentendida pode bem estar carregada de um contra censo, na medida em que o entendimento alonga-se em direção a estados compreendidos como maturação da Estrutura de Pensamento, equalização e necessidade de rigor no pensamento, redirecionamento existencial sob determinadas áreas da vida, e outros fenômenos correlatos. Na prática, o uso exacerbado de drogas com a finalidade de curar problemas de certas origens pode comprometer o processo de regulação do organismo, mascarando algo maior que, por sua vez converte, no tempo oportuno, em uma situação de difícil tratamento do ponto de vista do diagnóstico médico.
A Fé Irracional
Na perspectiva ainda de que com alguma fórmula mágica se possa abreviar dores e sofrimentos, pessoas com as mais variadas razões buscam por meio de uma terceirização da fé, calar angústias e inquietações buscando desesperadamente milagres urgentes. Se voltarmos a tempos remotos, constataremos que mentes que brilharam no mundo – poetas, santos, físicos, matemáticos, filósofos, não abreviavam e nem transferiam responsabilidades existenciais. Longe da idéia mórbida de apetite por sofrimento, esses gênios os quais por capricho os séculos  produzem um por vez, muitas vezes, utilizavam-se da solidão e do recolhimento para criarem obras que ensinaram e ensinam ao mundo, perpetuando o conhecimento e a sabedoria por toda a existência.
Recolhimento e solidão nos dias atuais ecoam algo como retrocesso, uma vez que a sociedade tecnológica, racionalista, revestida dos ideiais positivistas, instiga cada vez mais a que tudo seja feito o mais rápido possível. E quanto a isso há controvérsias, porque às vezes rapidez é prima-irmã da atitude irrefletida e geralmente causadora de danos por vezes irreversíveis.  Pular etapas é a “inteligência da vez”. O slogan da atualidade moderna chama-se ‘pressa’. A prematuridade em que o jovem se depara, por exemplo, com a necessidade de escolha da profissão é um tácito exemplo. Profissionais, principalmente em nível superior, em diversas profissões deparam-se com a formação comprometida em função da falta de maturidade. Na sexualidade, devido a precocidade, os resultados são a má orientação, fazendo com que jovens e adolescentes ultrajem o próprio corpo, cujos efeitos nefastos aparecem alguns anos depois; o uso de drogas na adolescência dão resposta a desventura que, antes, parecia ser uma abertura à vida. Levado tudo isso à soma, fica claro a necessidade de se ter estudos consistentes, a saber, em que e quais aspectos a abreviação do tempo é desejável. Além disso, há a necessidade de profissionais próprios a serem imbuídos na discussão, pois a aceleração de etapas é possível, porém, não deve ser regra. É algo que deveria ser tratado do ponto de vista da subjetividade humana. Isso equivale a dizer que é necessário um estudo a priori do ponto de vista de como é a temporalidade para a própria pessoa e não para um grupo de pessoas, classe,  cultura, etnia. Para algumas pessoas, a temporalidade não é um fenômeno determinante no processo de maturidade, quando para outras, é tudo o que importa para que se entenda o processo de se fazer homem, de se amadurecer mulher. E isso não é tudo, outros elementos constituintes precisariam ser observados.
Responsabilizando a Educação
Em educação, na ânsia e no calor da terceirização, as famílias transferem à escola momentos importantes da construção e maturação do caráter de seus filhos, abnegando-se de participar do processo porque já pagam a mensalidade escolar e com isso, eximem-se de tal tarefa. Do outro lado, essa atitude encontra acolhida até mesmo nos moldes orçamentário do governo que, por sua vez, vem insistindo em um projeto de terceirização das Universidades, agredindo frontalmente o direito expresso e irrevogável, que é o direito líquido e certo da sociedade em ter educação pública, gratuita e de qualidade. Com a terceirização da educação por parte da família, essa expressão forte Terceirização, corrobora para a destituição e desagregação familiar, porque os pais afastam-se dos filhos. Aliás, ao entardecer, quantas famílias transferem a necessidade da sua presença, do calor do diálogo honesto junto às crianças, transferindo essa responsabilidade para a compra de presentes na tentativa de construir uma espécie de medida de profilaxia educacional. Mas claro, tem explicação! Devido o divórcio ou a separação da comunhão estável, não há como estar tão presente, por isso é necessário terceirizar o ato de amar, às coisas. 
A Realidade no Ato de Terceirizar
O silêncio que ensina é hoje objeto de desprezo, porque não há tempo para silenciar tendo por orientação que há tanta coisa paralela a ouvir e tantas outras para falar, fazendo impossível silenciar. A soma de todos esses elementos fornece um mapeamento raso, mas original, do espectro pelo qual é possível enxergar o caos provocado pela terceirização.
Ao lançarmos os olhos sob os fins e não apenas sob os meios, notamos que desde o apogeu do racionalismo grego até o início deste século, em que as bases do conhecimento apóia-se quase que exclusivamente no uso da razão, busca-se uma resposta na tentativa falaciosa tomando a razão como resposta perene para responder às questões existenciais. A perplexidade não está necessariamente na busca de respostas, mas nas propostas de solução. Para saber o que penso dessa proposta de solução, releia os primeiros parágrafos.
Em Erich Fromm (1900-1980), filósofo e psicanalista, em sua obra A Arte de Amar, é ensinado que há uma propensão natural a entender o amor como algo simples. Segundo o autor, em toda a humanidade há uma propensão natural a acreditar que amar é algo corriqueiro e que acontece rapidamente.  Ainda segundo Fromm, a capacidade de amar só se adquire plenamente na madurez pessoal[1]: O amor infantil diz: amo-te porque te necessito - o qual é um afeto egoísta; mas o amor maduro expressa: necessito-te porque te amo.  

Não Terceirize sua Vida!


Wilson Barbosa
Filósofo Clínico &;
Técnico em Assuntos Educacionais,
IFTO - Inst. Federal do Tocantins,
Campus Porto Nacional

 


[1] http://pt.wikipedia.org
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